Terceira Casa?

No mapa astral, a Terceira Casa é o setor das comunicações e expressões,
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redor, sobre tudo. É isso aqui.







domingo, 8 de maio de 2011

Magia do mar


Nivaldo Pereira
Crõnica publicada no Pioneiro, 06/05/2011

Quando o cinema se fez corpo, na passagem do transatlântico todo iluminado, realidade e fantasia se fundiram de vez. O lugar para isso não poderia ser mais mágico: a mansa Baía de Todos os Santos, em frente à prainha onde há séculos Tomé de Souza aportou com sua comitiva para fundar a cidade do Salvador. Antes mesmo do nosso encalhe, eu já experimentava uma mescla de níveis de percepção entre o presente, o passado histórico e a minha própria memória, ao sabor dos reflexos da luz do Farol da Barra nas águas escuras da noite recente. Mas, embora este seja um relato impressionista, deve ter um início.

E tudo começa de tardezinha, com nosso embarque na lancha pilotada pelo Chico, meu cunhado. Nós, uns poucos amigos, nos abastecemos de cervejas e salgadinhos e fomos apreciar do mar o nunca repetido espetáculo do poente. A âncora foi baixada em local estratégico, defronte à mítica praia do Porto da Barra, onde até hoje malucos e poetas aplaudem o pôr-do-sol.

O Chico cuidou de respeitar o limite determinado pela guarda costeira para o trânsito de barcos, e lá ficamos, à flor d’água, inebriados de luz e mar. Eu nunca tinha visto a cidade daquela perspectiva: os coqueiros ao redor da Igreja de Santo Antônio, o Forte de Santa Maria, o Farol, os banhistas indiferentes ao cair da noite. Ah, era véspera do Dia de Iemanjá, senhora daquelas águas.

Sol se foi, noite veio, a gente ali, sem querer mais sair, mas chegou a hora de voltar. Lancha ligada, âncora acionada para subir – e nada. Algo nos prendia, embaixo d’água. O Chico girava o leme, e nada de a lancha sair do lugar. Descoberta: a âncora esta enroscada em algum cabo submarino! Estávamos encalhados!

Se é verdade que o tempo na Bahia flui em outro ritmo, cuidamos de sossegar, enquanto o piloto acionava o pessoal da marina. Logo viria um mergulhador, negro filho de Netuno, para nos libertar daquela doce prisão. E foi nessa espera que passou o transatlântico iluminado, ali perto. Delírio! Amarcord de Fellini! Uma bênção!

Dia seguinte, despejei seiva de alfazema no mar, na Festa de Iemanjá. Gratidão pelo presente da véspera.

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