Terceira Casa?

No mapa astral, a Terceira Casa é o setor das comunicações e expressões,
textos, falas e pensamentos. Sobre o quê? Sobre si mesmo, sobre o mundo ao
redor, sobre tudo. É isso aqui.







domingo, 22 de maio de 2011

Tiquetaque, tiquetaque


Nivaldo Pereira
Crônica publicada no Pioneiro, 20.05.2011

Atacou-me a tal tendinite, este mal da era dos computadores. Dores na mão direita, dedão, punho. Além do desconforto na digitação, cumprimentar alguém tem me feito ver estrelas, e até galáxias, se o aperto de mão da pessoa for muito forte. Depois de médicos, exames, diagnóstico, começo sessões de fisioterapia. E começo também a ter uma percepção surpreendente do tempo, pelo contato comigo mesmo e com outras pessoas em tratamento.

Logo no primeiro dia, divido a cabine dos estímulos elétricos com um simpático senhor, ele a curar o ombro esquerdo. Pergunto-lhe quantas sessões já fez. Umas 140, diz ele, gargalhando. Eu ri também. Bom humor me conquista sempre. Aí vem um silêncio, o tiquetaque do relógio marcando os minutos programados, e o homem traduz meu pensamento, falando de como o tempo passa devagar ali. A vida louca lá fora, a ansiedade na cabeça, e o tempo lento, lento em cada minuto de espera. Primeira sessão, primeira questão: o que eu tenho feito da necessária quietude, da paciência?

Dia seguinte, entre fios, conheço um rapaz bem falante, tratando da região lombar. Caminhoneiro acostumado a pegar pesos, teve que parar tudo, atormentado por dores cruéis. Ele reconhece que precisa de outro trabalho, mas está acostumado ao que tem, sempre fez isso. Eu argumento que ele está recebendo um aviso urgente do corpo e que não pode brincar com a saúde. Ele admite, fala de idéias de trabalho, mas não agora, quem sabe adiante. Finda a sessão dele, eu fico ao sabor dos ponteiros. E visto a carapuça: ando judiando da mão, na firmeza autoritária com que seguro as rédeas da vida. Há que dizer nãos, afrouxar, soltar.

No terceiro dia, sozinho na cabine, tento traduzir a fala do tiquetaque, em meditação forçada. Devagar, devagar: parece dizer o relógio. Ainda há sessões a fazer – e eu sem poder seguir a freqüência devida. Tiquetaque, tiquetaque. Medo de ti, ó Cronos, deus do tempo, severo professor. Sejas tu camarada, sejas leve em teus decretos de limites. Prometo aprender a lição dos tempos, na paciência da cura. Mas de ti apenas escuto: tiquetaque, tiquetaque...

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