Terceira Casa?

No mapa astral, a Terceira Casa é o setor das comunicações e expressões,
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redor, sobre tudo. É isso aqui.







segunda-feira, 3 de outubro de 2011

O mistério das moedas


Nivaldo Pereira

Crônica publicada no Pioneiro, 30/09/2011

Começo esta história pela conclusão que tirei dela: a gente nunca sabe direito quem é o outro, e esse mistério estimula a criação de explicações que não passam de extensões do nosso próprio mundo. Pareceu complicado? Vamos à história, então.

O prédio vizinho ao meu, com um poço de luz separando-os, termina dois andares abaixo das minhas janelas, mas há no terraço dele um anexo que se eleva por mais um andar. Talvez seja uma casa de máquinas, esse bloco logo abaixo do meu vizinho da direita.

Anos atrás, dia após dia, enquanto olhava a paisagem da tarde, eu notava o aparecimento de moedas na laje do bloco retangular. As moedas, de cinqüenta centavos e um real, faiscavam ao sol poente, e eu ficava intrigado sobre a origem delas. Alguma criança teria atirado-as ali? E por que continuava a atirá-las seguidamente? Um adulto? Quem seria esse vizinho? Seria por promessa? Oferenda aos entes das ruas?

Quase nunca aparece gente no terraço vizinho, e nunca vi ninguém subir ao anexo, de modo que as moedas foram aumentando e provavelmente despertando a curiosidade de outros moradores do meu prédio. Se o autor não fosse o louco literal que atira dinheiro fora, certamente seria um crente em simpatias e afins. Tipo: jogue uma moeda de um real no telhado vizinho, que sua conta bancária engorda!

Certa feita, uma amiga veio visitar-me e, vendo aquela grana brilhar na laje, deu-se ao trabalho de contá-la e concluiu que não ia demorar a haver alguma caça ao tesouro. Dito e feito. Um tempo depois, notei um zunzunzum lá fora e dei de cara com uma cena insólita. Do apartamento à direita do meu, desocupado e em reformas, dois pedreiros “pescavam” o dinheiro. Aliás, vou retirar as aspas, pois eles pescavam mesmo as moedas, com uma extensa vara de pescar e um ímã na ponta. Tique, tique, tique, tique: as moedas foram se grudando ao ímã. Todas.

Os dois viram que eu os observava e riam, quem sabe com a sensação de “fomos mais espertos que você”. Aí a laje voltou a ser mero teto. O atirador de moedas sumiu ou parou com isso. E eu fiquei com mais um mistério sobre a vida em sociedade.

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