Terceira Casa?

No mapa astral, a Terceira Casa é o setor das comunicações e expressões,
textos, falas e pensamentos. Sobre o quê? Sobre si mesmo, sobre o mundo ao
redor, sobre tudo. É isso aqui.







terça-feira, 12 de abril de 2011

Um minuto mais


Nivaldo Pereira
Crônica publicada no Pioneiro, 08/04/2011

Não sei se é marca da minha geração, crescida sob os ventos da emergente cultura pop, o fato de eu sempre evocar as coisas que aprendi nos discos. Um verso iluminado de Gilberto Gil, por exemplo, tem me servido de guia, nos muitos desembarques que vêm marcando minha rotina. Pertence à canção Cada Tempo em Seu Lugar, e diz assim: “Se eu ando o tempo todo a jato, ao menos aprendi a ser último a sair do avião”. Já notaram o alvoroço que assola os passageiros de ônibus e aviões na chegada ao destino?

Mal se avista a rodoviária ou a aeronave toca o chão, todo mundo se assanha: é preciso sair logo. E os corredores viram lugar de empurra-empurra, de mãos tirando coisas do bagageiro, de gente afobada em desocupar as poltronas onde até então lia ou ressonava na paz da viagem. A grossura impera, porque atropelamentos serão inevitáveis nesse estouro de boiada. Às vezes, é preciso o comissário de bordo esbravejar a ordem: “permaneçam sentados e de cintos afivelados, por favor”.

O que dá na gente, nessas horas, para querer sair voando no chão? Para onde vai a educação? Entendo que há compromissos, conexões para outros vôos, alívio do pânico de altura, vontade de abraçar quem estiver à espera, dor de barriga e até a disputa por um táxi adiante. Mas desconfio que a maioria das pessoas segue uma pressa doentia sem motivo algum, senão o hábito. O hábito de viver com pressa. Para nada.

Vivemos a cem, a mil, a milhão. A inocente ânsia de tirar vantagem de cada segundo, numa competição sem argumento, é a mesma que pode ser a sentença de morte no avanço do sinal vermelho ou na ultrapassagem do trânsito. Um traço de irracionalidade. Ou de burrice mesmo.

É preciso estar atento e forte, diz outra canção do Gil. Tento ficar atento nas horas dos desembarques, firme e forte na decisão de não entrar na correnteza da pressa louca dos outros. Procuro ser um dos últimos a sair do ônibus ou do avião. Basta esperar um minuto mais. E este será um instante de consciência e respeito ao tempo. Um instante sereno e iluminado, quando e regra geral é andar sempre a jato.

Aprendi isso numa canção.

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