Terceira Casa?

No mapa astral, a Terceira Casa é o setor das comunicações e expressões,
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redor, sobre tudo. É isso aqui.







terça-feira, 12 de outubro de 2010

A espada e o elixir


Nivaldo Pereira
Texto publicado no Pioneiro, 08/10/2010

Na pedra lisa da gruta, à luz da vela artesanal, a silhueta do velho se agigantava em sombras fantasmagóricas. Frêmitos de medo ondulavam a alma do rapaz. Não medo do velho, o eremita a quem viera pedir ajuda, mas medo da jornada por iniciar. Preste bem atenção, pedia o homem de barbas brancas, porque a atenção é uma das armas na luta primeira contra o monstro guardião do portal. Três cabeças tem a fera, e devem ser cortadas de um só golpe, sob pena de se multiplicarem na razão de uma para três. Sua espada deve estar untada em vontade, disciplina e tempo. Sem isso, continuava a alertar o velho, de pouco vai adiantar adentrar ao reino mágico, pois até as maravilhas e sapiências fenecem sem uma entrega voluntariosa. E o rapaz sorveu cada palavra do mestre.

Fora da gruta, o sol e o calor tépido logo o encheram de coragem. Sacou da cinta a espada, depositou-a sobre uma rocha como num altar. E agora? Como lustrá-la de vontade, disciplina e tempo? Isso o mestre não ensinara, mantendo-se mudo quando o rapaz repetiu a questão. E disso o jovem já sabia, avisado por experientes cavaleiros: o sábio nunca entregava o que carecia de ser descoberto por cada um. Vontade, disciplina e tempo. Ah, houvesse tudo junto em poções de elixir... Pode até ser que exista, mas em que longínquo reino, encerrado em alguma torre guardada por um dragão? Buscar o elixir seria fugir da jornada que o aguardava, ali bem perto.

A noite avançou, o rapaz acomodou-se junto à rocha. Precisava pensar, e foi nesse fluxo que adormeceu. Num sonho, uma donzela de manto azul sussurrou-lhe: pergunte-se por que deseja entrar no reino mágico, e dentro de si vai encontrar o lustro da espada. Ele acordou de pé. Por que entrar no reino? Porque ali, diziam todos, encontra-se sabedoria poder e liberdade, e precisava disso tudo para sagrar-se cavaleiro. Era o que mais queria: ser alguém. Era seu foco de ação imediata. E era já.

Assim, munido da espada da atenção, o jovem decepou as cabeças do monstro que exala dispersão, preguiça e adiamento e que impede a entrada dos fracos ao reino mágico chamado Livro.

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