Terceira Casa?

No mapa astral, a Terceira Casa é o setor das comunicações e expressões,
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sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Só tem corredor? Oh dor!


Nivaldo Pereira
Crônica publicada no Pioneiro, 22/10/2010

Que poltrona, senhor? Qualquer janela. A história se repete nos guichês das rodoviárias: a maioria dos passageiros prefere viajar no assento da janela. Eu não fujo à regra. E experimento a frustração geral quando a atendente informa: só tem corredor. Criei uma teoria para explicar essa opção. Como viajar evoca as aventuras de outros tempos, quem escolhe a poltrona do ônibus é sempre a nossa criança interior, aquele menino ou menina que ainda nos habita. Porque criança de lei não abre mão da janela. Nunca.

É certo que já houve tempos em que os ônibus lotavam quais latas de sardinha. Alí, tadinho de quem sentava no corredor, pois teria uma turba a cair-lhe por cima a cada curva. Em caso de calor, a chave da ventilação era a janela, na jurisdição do outro passageiro, a quem também pertencia o manejo da cortina contra o sol. No quesito visual, o da janela tinha a paisagem lá de fora, sempre em movimento, fazendo a viagem fluir, enquanto ao do corredor cabiam monótonas panças e bundas. Ninguém era besta de preterir o poder e o movimento da janela.

Acontece que mudou tudo. Os ônibus interurbanos, que fazem viagens de fato, já não transportam passageiros em pé (em tese), e as janelas não mais se abrem, por conta da climatização interna. Sendo assim, quem se senta no corredor tem muito mais espaço, para além da guerra de cotovelos pela posse do apoio do braço entre as poltronas. Aliás, esse suporte separador é mais sujeito a invasões e atentados territoriais do que o velho Tratado de Tordesilhas. Às vezes, o janeleiro despreza a paisagem para manter a vigilância do suporte de braço e não deixar o vizinho se espraiar.

Ok, o passageiro da janela sempre terá uma paisagem mais aberta. Mas, e nas viagens noturnas, por que a mania da janela prossegue? E se a gente constatar que quem viaja na janela é mais vulnerável em caso de acidentes? Ora, tudo isso é mero bom senso adulto, que nada vale quando surge a possibilidade da viagem – e de aventura – e a nossa criança interna, teimosa e competitiva, já pula gritando: a janela é minha! E mostramos a língua aos demais.

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