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sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Guerreira Dadá


Nivaldo Pereira
Crônica publicada no Pioneiro, 10/09/2020

Dias atrás, conheci o cineasta cearense Rosemberg Cariry, homenageado do nono Festival Santa Maria Vídeo e Cinema. Sou fã do Cariry há muito, pelo seu resgate profundo e sensível de temas e figuras da cultura nordestina, como o casal cangaceiro Corisco e Dadá e o poeta Patativa do Assaré. O cineasta contou do seu antigo fascínio pela figura de Dadá, em episódios que me deixaram muito emocionado, a pensar na força trágica de certas vidas.

Dadá era o apelido de Sérgia Ribeiro da Silva, menina que, aos 12 anos, no sertão da Bahia, fora raptada e estuprada por Cristino Gomes da Silva Cleto, vulgo Corisco, ou Diabo Louro, destacado cangaceiro do bando de Lampião. Dadá não perdoou a violência de Corisco. Mesmo no bando, rejeitou o quanto pôde o amante de ocasião, e este investiu na conquista, até o asco virar respeito, afeto, virar amor. Aprendeu com Corisco a ler, contar e atirar. Era hábil no manejo da pistola. Entre espinhos e perseguições, os sete filhos do casal foram ficando pelos caminhos e caatingas, na casa dos outros.

Quando Lampião e Maria Bonita foram mortos, em 1938, Corisco e Dadá já não estavam no bando. Mas a polícia, munida de metralhadoras, finalmente encurralou os dois, em 1940. Corisco foi morto. Dadá reagiu a tiros – e Cariry chamou a atenção para o fato de o cangaço nordestino chegar ao fim na luta armada de uma mulher! Ferida na perna, que terminou amputada, Dadá foi levada presa a Salvador. Anistiada depois, casou-se de novo, e partiu para outra luta: juntar os restos do corpo de Corisco, sepultado no sertão, à cabeça cortada do cangaceiro, que ficara exposta num museu de Salvador, ao lado das cabeças de outros membros do bando – macabros troféus da “civilização”. Somente em 1969 ela conseguiu seu intento, e a ossada completa do Diabo Louro ganhou sepultura.

Em 1996, Rosemberg Cariry lançou o filme Corisco e Dadá, com Chico Diaz e Dira Paes. Era a história da falante e simpática velhinha que ele conhecera em Salvador e que morrera dois anos antes, aos 79 anos. Era a história de uma mulher nordestina – uma brasileira guerreira chamada Dadá.

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