Terceira Casa?
No mapa astral, a Terceira Casa é o setor das comunicações e expressões,
textos, falas e pensamentos. Sobre o quê? Sobre si mesmo, sobre o mundo ao
redor, sobre tudo. É isso aqui.
sábado, 6 de agosto de 2011
Do angu à polenta
Nivaldo Pereira
Crônica publicada no Pioneiro, 29/07/2011
Um pouco de água numa panela, uma pitada de sal, acrescenta-se farinha de mandioca aos poucos, mexendo sempre para não embolar, até a mistura ficar na consistência desejada, retira-se do fogo. E está pronto o angu, que muitos vão chamar de pirão. Eu sempre fui chegado num angu, coisa da infância, como um estágio posterior à papa primordial, mas com semelhanças. Minha mãe sabia desse meu gostar: naqueles agrados de convalescença de gripes e afins, lá vinha ela com um prato de angu e um bife com molho em cima.
Eu adorava espalhar o angu pelas bordas do prato, para esfriar, e ir comendo pelas beiradas. Ou então sulcava trincheiras por onde o caldo do bife escorria, delimitando regiões no maleável território do angu. Com essa comida lúdica, eu chegava a abrir mão do arroz com feijão para preferir um bom anguzinho como base. Tanto que ganhei do Osvaldo, um excêntrico primo do meu pai, o apelido de “menino do angu”. Angu e infância são indissociáveis para mim.
Em outras regiões do Brasil, o angu se faz com farinha de milho, como em Minas Gerais. E adivinhou quem enxergou nessa variação mais rústica a célebre polenta italiana. Angu de milho e polenta: tudo farinha do mesmo saco. Eu, que desconhecia a polenta mole e que tive com esse prato da culinária serrana uma identificação plena, já trazia na memória das papilas gustativas o efeito da variante angu. Adoro polenta mole e levo prejuízo quando a encontro nos bufês a quilo, porque, tão barata (no custo de produção) quanto pesada na balança, ela joga minha conta lá para cima. Mas quem mandou encher o prato, ó guloso?
Curioso é que, modos de preparo e caprichos à parte, a polenta trazida pelos imigrantes italianos já era comida no Brasil há séculos com o nome de angu. O milho é originário do continente americano e foi levado à Europa pelos navegadores vindos de lá, como o genovês Cristóvão Colombo. Por esse enfoque, polenta mole é o angu de volta às origens.
Agora vou me imaginar menino cavando um vale no prato de angu/polenta mole para inundá-lo com uma montanha de frango ao molho. O passado adora traçar destinos.
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